quarta-feira, 12 de novembro de 2014

Memórias de uma cidade que não pára


   
Rio noturno: Enseada de Botafogo, Urca, Pão de Açúcar e Niterói ao fundo

      Dono de uma das mais ricas histórias do Brasil, o Rio de Janeiro completará 450 anos de fundação no ano de 2015. Ao longo dos anos, seguindo o ritmo intenso de desenvolvimento dos centros urbanos, a cidade foi se transformando, mas tais mudanças em sua paisagem têm provocado dúvidas, especialmente, quando contribui para a perda da memória histórica do cidadão.  
         Basta um rápido passeio pelo Centro para observarmos essa metamorfose: As novas formas que aos poucos redefinem a Lapa; a demolição da Perimetral – que refletiu visivelmente no trânsito da principal avenida do Rio, alterando a dinâmica de toda a zona central; e o Porto Maravilha, que passa por um processo de revitalização, inaugurou o Museu de Arte do Rio e ainda pretende inaugurar até as Olimpíadas de 2016, o Aquário da Cidade e o Museu do Amanhã.
       Anterior a declaração da Unesco e ao decreto de 2012 que chancelou o Rio de Janeiro com o título de Patrimônio Mundial como Paisagem Cultural Urbana, algumas intervenções na cidade provocaram a perda de lembranças importantes. “É interessante que a preservação exista para que as fontes primárias da história, da arquitetura e do urbanismo sempre estejam disponíveis. O prejuízo para a memória, não só a carioca, é criar ausências, apagamentos na história de povos, de identidades, de grupos étnicos”, afirma a professora de história Patrícia Comarck.
     Nesta seara de mudanças, o Palácio Monroe e o Mourisco são dois exemplos que sofreram transformações irreversíveis, por conta dos mais diferentes motivos, sejam políticos, estéticos ou até mesmo circunstanciais. O primeiro foi demolido apesar de não ter sido empecilho para a construção do metrô e deu lugar a praça Mahatma Gandhi; já o segundo foi reconstruído sem levar em conta o estilo Mouro que o caracterizava.
     Popular na Espanha do século XIII, os traços da arte Moura consistiam em arcos grandiosos e elementos esculpidos de modo ocasional e sucinto. Tal fato revelava aspectos de um período da história brasileira que se concretizava para além dos livros didáticos. “Na Educação, essas construções são interessantes para compor aulas de visitação temática. Indo ao local, lidando com a ambientação, a gente pode explorar melhor os valores arquitetônicos, a parte menos teórica, investindo na imersão do aluno”, diz Patrícia em sua experiência com estudantes do ensino fundamental.
     Ainda hoje algumas demolições em prol da modernidade suscitam dúvidas, mas há uma geração de pessoas, dentre elas pesquisadores e professores cada vez mais atentos a preservação da história e da identidade desta que continua sendo a cidade maravilhosa. Aproveite para conhecer mais sobre perfil histórico do Palácio Monroe e do Mourisco:

Palácio Monroe    


O Monroe e o Metrô em construção
                                              
     Construído no início do século XX, o palácio foi projetado pelo arquiteto e engenheiro militar Coronel Francisco Marcelino de Souza Aguiar para ser o Pavilhão do Brasil durante a Exposição Universal de 1904, em St. Louis, nos Estados Unidos. Após a exposição a estrutura metálica do prédio – desmontável – foi trazida para cá e remontada, em 1906, para sediar a III Conferência Pan-Americana.
     Ao criador do Pan-Americano, o presidente norte-americano James Monroe, foi feita a homenagem, batizando o edifício de Palácio Monroe. O prédio abrigou a Câmara dos Deputados, o Senado Federal, e o Tribunal Superior Eleitoral, e, durante a ditadura militar, foi transformado em sede do Estado Maior das Forças Armadas.
     Durante as obras de construção do Metrô do Rio de Janeiro, em 1974, cujo túnel foi desviado com a finalidade de preservar as fundações do Palácio, o governo do estado decretou seu tombamento. Não se sabe ao certo o que levou à demolição do edifício, porém, uma das teorias diz que o presidente Geisel aproveitando do apoio dado pelo jornal O Globo, por arquitetos modernistas da época e por parte da população levou o imóvel ao fim por uma questão meramente pessoal.

O belo Palácio que em 1974 seria demolido

     Ernesto Geisel, não só vetou o tombamento como decretou a demolição do palácio, alegando que sua presença atrapalhava a visão do Monumento Nacional aos Mortos da Segunda Guerra Mundial – Monumento aos Pracinhas. Hoje, no lugar onde existiu o Palácio Monroe encontra-se a Praça Mahatma Gandhi.

A praça Mahatma Gandhi no lugar do demolido Monroe
Mourisco


O atual Mourisco no início da Praia de Botafogo

     As histórias, porém, não se limitam ao Centro. Na orla de Botafogo, o lugar onde hoje desponta o famoso Mourisco, até a metade do século passado era ocupado por outro prédio. O nome era o mesmo, mas a arquitetura em nada lembrava o atual.
     O edifício original, construído no estilo mouro – o mesmo estilo arquitetônico empregado na Fiocruz – abrigou um restaurante, uma casa de chá/sorveteria e até mesmo uma biblioteca infantil (uma das primeiras a permitirem – e encorajarem – a presença de crianças desacompanhadas), administrada por ninguém menos que Cecília Meireles.

O prédio do Mourisco original

     Durante o Estado Novo, a ditadura do governo do presidente Getúlio Vargas fechou a biblioteca e o local passou a ser utilizado como ponto de coleta de impostos. Em 1952 o prédio foi demolido para dar espaço à obra de construção do Túnel do Pasmado. Hoje, a biblioteca deu lugar a lojas de grifes em um centro empresarial sofisticado, com direito a um heliporto.

Artigo escrito por Gabriel Arouca / Gustavo Rocha

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