terça-feira, 30 de setembro de 2014

Madame Satã, figura mitológica da Lapa do século XX

João Francisco dos Santos é pernambucano e nasceu em 1900, conhecido como Madame Satã, mudou-se para Lapa em 1907. Sem profissão e analfabeto, vivia de bicos como entregador de marmita, cozinheiro e segurança nos bares e bordéis da região. Era homossexual, pobre e negro, usava sempre cabelos cumpridos e alisados, vestido com terno branco de linho e chapéu panamá. Provavelmente muitos da minha geração não o conhecem, porém desde muito nova ouvia as suas histórias e hoje, posso observar que Satã sempre representou a verdadeira contracultura brasileira.

De vez em quando cometia roubos, para se proteger e agir, com sua ginga de capoeirista. João, fã do filme de Cecil B DeMille, torna-se Madame Satã, transformista, figura mítica da boemia carioca. Uma espécie de gunfighter da Lapa, fechando bares e enfrentando as terríveis Polícia Especial e D.G.I. (Departamento Geral de Investigações), que enchiam de medo quem andasse nas ruas do bairro.

Em 1907, quando Satã chegou na Lapa o processo de reforma urbana permanecia, a destruição de cortiços e o desmanche de morros. A modernidade que chegava afastava do centro do Rio de Janeiro as populações mais pobres. Nesse processo, a Lapa se tornou um refúgio, onde os expulsos que não eram empurrados para o subúrbio, procuravam moradia por ali. Por essa razão, podemos dizer que o fato de haver perseguição aos moradores do bairro, na época sua maioria prostitutas, cafetões e desempregados, fez com que Satã se tornasse tão famoso e, devido ao grande número de polícias nas ruas para combater aquele povo intitulado “desocupados” pela sociedade, perseguido.

Matame Satã era daqueles que não se arrependia e nem “levava desaforo para casa”, batia, matava e roupava mesmo, tudo pela sua sobrevivência. O ambiente de violência não era relacionado apenas a miséria latente, mas também as relações que eram estabelecidas como citei acima. As relações com a polícia, perseguidora de Satã, sempre marcadas por conflito. Mesmo as alianças tinham como essência a brutalidade. Em sua vida foram 29 processos e três homicídios, resultado de 27 anos de cadeia.

Podemos perceber a importância de Madame Satã como figura mítica da Lapa na metade do século XX, por ser parte do processo de construção da identidade dos setores excluídos. Madame Satã ficou preso por muitos anos na Colônia Penal de Dois Rios, em Ilha Grande. Depois que saiu da prisão continuou morando na Ilha, e em abril de 1976, aos 76 anos, faleceu.

Segue o link da entrevista que Madame Satã concedeu para o Jornal O Pasquim, em 1971. Através dela podemos saber, por ele, como foi sua vida. Os entrevistadores são Sergio Cabral, Paulo Francis, Millôr Fernandes, Chico Júnior, Paulo Garcez, Jaguar e Fortuna.

http://www.tirodeletra.com.br/entrevistas/MadameSata.htm

Amanda Laynes

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